quarta-feira, 10 de março de 2010
Pel Caç Nat 60 Guiné 68/74 -P61: Aquele dia, (Dez de Março de 70!)
[Guiné]
Decorria então o Ano de 1970 na Guiné.
O primeiro cabo Seleiro a porta da habitação, cinco dias antes do acidente.
Quartel de S. Domingos.
Sector Militar, de São Domingos:
Algures nas matas da Guiné, junto a fronteira do Senegal.
Destacamento de São Domingos, sete trinta da manhã o pelotão de caçadores Pel Caç Nat 60.
Sai com destino, a fronteira do Senegal objectivo pintar os marcos que faziam a divisão da fronteira Guiné/Senegal...
As dez e meia da manhã volvidos os primeiros vinte quilómetros já em plena mata há uma chamada de atenção, alguma coisa se passa.
Os Homens paçam a palavra até chegarem a minha secção.
Sou informado que na frente, foi detectada uma mina anti-pessoal os Homens ficam nervosos.
Quando cheguei ao local da mina, o Alf Mil Hugo Guerra, informa que vai tentar levantar a mina, Decorridos alguns minutos pergunto ao Alf Mil Hugo Guerra como iam as coisas o que ele me responde que estava nervoso.
O Alf Mil Hugo Guerra da a ordem para que a mina seja desactivada.
Tomei o lugar dele junto da mina.
Procede-se a segurança do local para que as coisas decorram sem incidentes.
Mando afastar os Homens a uma distância razoável, processo que requer muita atenção.
Procede-se a desminagem do local, o momento de muita tensão...
O passo seguinte é desmontar o sistema da mina, que é constituido por a Dinamite, o
detonador este o mais perigoso que requer particular cuidado...
O inevitável aconteceu, a mina estava armadilhada e explode, gritos, confusão, leva algum tempo até os Homens se recomporem.
Esta fotos foram tiradas junto a porta da arrecadação do velho quartel de S. Domingos.
A foto mostra as três minas em situações diferentes.
A primeira está fechada e pronta a ser acionada.
A segunda está aberta, vê-se a dinamite e o mecanismo.
A terceira está aberta vê-se todo o mecanismo desmontado.
No momento tudo ficou em silêncio depois as vozes de algums soldados Que se aproximavam.
Senti umas mãos que me seguravam, era o enfermeiro José Augusto, que me prestava os primeiros socorros, colocava os garrotes para parar as hemorragias, o soro e uma injecção para as dores.
Alguns homens preparavam uma maca, com as camisas e uns paus para me transportar, fizeram cinco quilómetros comigo através da mata serrada.
O Alf Mil Hugo Guerra sai ferido com alguma gravidade…
Como estava relativamente perto de mim foi atingido por estilhaços.
Na foto acima está o Ex Alf Mil Hugo Guerra e o primeiro cabo Seleiro.
Pelo Rádio foi pedido ao quartel de São Domingos para mandarem viaturas ao nosso encontro para chegar mais rápido apista onde deveria estar uma avioneta a espera.
Assim foi quando chegamos a pista já lá estava avioneta, fui entregue á enfermeira Pára-quedista, (quero aqui prestar a minha homenagem a estas Mulheres, em particular a enfermeira Ivone).
Estas Mulheres muitas vezes corriam o risco quando tinham de socorrer os feridos em pleno combate...
Meia hora depois chegam a Base Aéria e fui levado para o Hospital Militar de Bissau.
Já no hospital, foram feitas as primeiras intervenções cirúrgicas, provavelmente devido as anestesias perdi a noção do tempo, e do local onde me encontrava.
Num momento de lucidez ouvi passos, que se aproximavam perguntei:
Onde me encontrava, foi me dito que estava no hospital de Bissau, perguntei quando ia para Lisboa: a resposta foi amanhã.
No dia seguinte pela manhã, tive a visita do Governador da Guiné o General António de Spínola.
Que deixou palávras de consolo e rápidas melhoras, e um elogio pelo dever de servir a Pátria...
Nesse mesmo dia a noite saí da Guiné no avião Militar.
Cheguei a Lisboa no dia treze de Março por volta das cinco da manhã caía uma chuva miudinha.
As macas eram muitas pois este avião Militar fazia o transporte de Angola, Moçambique, e Guiné, Em Lisboa as ambulâncias faziam o percurso de noite para não chamar a atenção dos lisboetas.
Nesta altura já estava internado no hospital Militar, na Estrela
Serviço de cirurgia plástica.
Quero aqui informar que logo que dei entrada neste serviço, entrei em coma...
Só decorridos quinze dias recuperei a consciência.
A partir da qui foi um desencadiar de acontecimentos uns bons e outros maus.
Descobri que não tinha uma das mãos o braço esquerdo estava com gesso, e tinha os olhos com pensos este foi o primeiro choque que sofri.
Os dias iam passando lentamente, até descobrir que estáva cego...
Mas o mais grave desta situação, a minha família não sabia que eu estava gravemente ferido no hospital Militar, os serviços do Exército não comunicaram o facto a minha família.
Os meus pais tiveram a informação por um amigo meu que por essa altura prestáva serviço no hospital militar.
O tempo decorrido da minha chegada a Lisboa, até os meus pais terem conhecimento foi de 23 dias...
No ano de setenta completei vinte e quatro anos estáva na flor da idade, andei de serviço em serviço durante mais quatro anos.
Em setenta e cinco saí do hospital Militar com a bonita recordação, cego, sem a mão direita e dois dedos na mão esquerda.
Moral baixa estado psicológico baixo.
O hospital Militar não dispunha de Psicólogos...
*A data que consta no texto a cima é a minha versão do acidente.
A versão do Alf Mil Hugo Guerra aponta para o dia 13 de Março.
Entrada para o serviço Militar 18 de Abril de 67.
Partida de Lisboa, 12 Julho 1968 para a Guiné.
Acidente na Guiné 10-03-1970
Manuel Seleiro
Primeiro cabo
DFA,
_
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4 comentários:
Meu caro amigo Seleiro
Só quem viveu ou presenciou acidentes dramáticos como este, ou esteve em zona de guerra, sabe avaliar a verdadeira dimensão da tragédia, tanto a nível físico como psicológico. E como eu já tive oportunidade de lhe contar, infelizmente testemunhei acidente identico que ocorreu com o meu Alferes, tendo o mesmo sofrido o mesmo tipo de lesões. Assisti a muitos acidentes com minas, na guerra colonial, no ano 1971/1972quando estive em S. Domingos, era rara a saída para o mato em que não ficava algum camarada sem um pé ou sem uma perna, ou outras lesões graves. É arrazador e indescritivel, os sentimentos que estas lembranças nos provocam, e por muitos anos que vivamos nunca se apagarão da nossa memória.
Dado que a geração dos que sobreviveram à Guerra Colonial, em que foram obrigados a participar, começa a estar em extinção, tendo agora cerca de 60 ou mais anos, não podemos deixar de passar o nosso testemunho aos nossos filhos, para que os mesmos transmitam às gerações vindouras que nenhuma Guerra conduz à Paz ou à felicidade, e não resolve problemas só taz desgraças!
Segundo a "Cronologia Trágica", de José Brandão, estima-se que em 13 anos de "Guerra do Ultramar" tenha havido cerca de "9.000 mortos, cerca de 30.000 feridos evacuados, em mais de 100.000 doentes e feridos, dos quais resultaram perto de 14.000 deficientes físicos, (5.120 com grau de deficiência superior a 60 por cento) e ainda, possivelmente, 140.000 neuróticos de guerra, rara é a família portuguesa que não foi ferida pela Guerra de África.".
Um grande abraço de coragem ao meu amigo Seleiro e o meu agradecimento a Deus por estarmos vivos.
Bernardino Parreira
Caro Parreira:
O amigo diz tudo no seu comentário.
No momento da explusão, a sena devia ser terrível para os camaradas que a presenciavam...
Muitas vezes sem poder fazer nada.
Todas as guerras são injustas e desomanas por vezes atinge o cúmulo da barbaridade.
Para mim o dramático de uma guerra, são as minas, que não teem rosto, num segundo toda uma vida fica destruida.
Depois de uma guerra terminar as minas continuam a matar pessoas inocentes.
Um abraço, Parreira.
Manuel Seleiro
Meu amigo Seleiro
Realmente, eu pouco mais posso dizer aquilo que tenho dito.No seu texto demonstra bem o mal protegidos que nos estivemos e tao pouco protegidos.Quando voce diz macas feitas das camisas, mostra bem o que nao tinha o Exercito Portugues e ate parece que era-mos nos os guerrilheiros. Sabe afinal nos estava-mos protegidos por material bem artesanal.Nao valeu a pena foi um crime contra a Humanidade onde as vitimas meu amigo, foram voces por quem eu tenho imenso respeito. Muito abrigado pela sua valentia, coragem e sacrificio.
Amigo Plácido ovrigado pelas suas palávras.
Todo o material estáva velho andava preso com arames...
Um abraço Plácido.
Manuel Seleiro
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